É que é com muita indignação, desprimor, raiva, até mesmo muito algum ressabiamento, que vejo criticar o dito.
Eu, que às vezes distraio-me e acabo por ver coisas que mas ninguém vê, fui novamente à caça do filme, não fosse dar-se o caso de eu ter visto uma outra versão qualquer adulterada, mais cor de rosinha, polida e não a que tantos falam. E vi. Voltei a ver. Vi mais uma vez com muita atenção e com o som bem alto para ter a certeza que nada me escapava. Eis então que me sinto perdida, até mesmo defraudada. É que na versão que eu vi não encontrei nenhuma Ana rameira disposta a mostrar tudo e mais um par de botas a quem quer que fosse. Não vi nenhuma sopeira com buço, lenço na cabeça a servir as pessoas retirando-se de seguida a andar para trás, sem voltar as costas e a fazer vénias a quem fica. Não vi o tal senhor António lacaio a limpar casas de banho, nem tão pouco o Chef Avillez a servir às mesas e a anotar pedidos de fish & chips num bloco com nódoas de gordura.
Juro que procurei, procurei e não vi nada daquilo que o Pedro Bidarra viu aqui, levando-o a escrever ISTO!
A Ana que eu vi no filme foi uma Ana bem disposta, uma Ana jovem que, com gosto, mostrou, não alguma coisa da qual se deva envergonhar, mas um bocado da cidade dela a quem a quis conhecer. Eu já fui essa Ana e, felizmente, já tive quem fizesse o mesmo papel para mim, sem que para isso tivéssemos de dar mais do que umas boas gargalhadas e fazer mais do que novos amigos pelo mundo. O Chef Avillez não me pareceu um empregado de mesa, mas sim um Chef gentil o suficiente para dar a conhecer a cara que está por trás de um prato elaborado, um Chef capaz de dar um sorriso a quem lhe enche a casa sem que por isso lhe caíssem os parentes na lama. Gosto dessa proximidade, atenção e atendimento personalizados nos sítios que elejo como "os meus sítios", factores esses que fizeram com que fossem eleitos como tal. Não é, seguramente, pela cagança ou arrogância com que me atendem, que me fazem voltar. Para mim só vi a diferença entre um pato bravo proprietário de um restaurante da moda e um restaurante onde simpatia, bom gosto e simplicidade não significa simplório.
Não vi um senhor António de joelhos a esfregar os cantos da sanita para que alguém cague nela a seguir, de preferência enquanto ela ainda a limpa de gatas. Vi antes alguém preocupado para que o serviço que presta seja bom, agradável e com pormenores que lhe atestem a qualidade e fazem a diferença entre um hotel onde somos bem recebidos e um Ibis de aeroporto.
Aquilo que eu vi foi um turismo feito de gente, de pessoas, de simpatia, de abertura, de boas-vindas. Vi aquilo que eu espero que me aconteça de cada vez que eu viajo e o mesmo que eu tento fazer sempre que conheço alguém de fora que por aqui anda perdido. Vi aquilo que, esteja eu no meu país, na minha cidade ou noutro qualquer sítio do mundo, me faz querer voltar, seja a um hotel de 5 estrelas ou uma pensão, a um restaurante da moda ou uma tasca.
Porque para mim são os sorrisos que encontro, o serviço que me prestam, as pessoas que conheço, que me fazem gostar tanto de viajar. O que de melhor trago de cada vez que viajo não vem nos roteiros turísticos nem se vê nos passeios de autocarros que percorrem os pontos de interesse em meia dúzia de horas, não está no sorriso amarelo do recepcionista do hotel, nem nos maus modos do empregado do café que me atira com o pacote de açúcar para cima da mesa, não está no restaurante pretensioso onde se podem encontrar manjares do mais sofisticado que já se viu, mas onde o atendimento é tão ou mais pretensioso quanto o restaurante pretende ser.
A menos que a nossa noção de turismo de qualidade seja ao estilo cadeia Iberostar na Republica Dominicana ou um hotel de 30 andares plantado numa praia de Benidorm, não vejo nada de humilhante no tal vídeo.
Parece-me a mim, pessoa que gosta de viajar, que já passou por alguns países, do 1º ao 3º mundo, de hotéis de 5 estrelas a holtals, que já teve locais como guias turisticos, que já se apaixonou além fronteiras, que já fez de guia turistica no seu país e no país dos outros, que um atendimento personalizado, que um serviço prestado com gosto, qualidade e simplicidade, que a arte do bem receber, que o prazer de mostrar aos demais o que de melhor há por esse mundo fora, não é significado de subserviência nem tão pouco que o luxo e a qualidade caminham ao lado da arrogância, do snobismo e da cagança, mas isso sou eu, que não ando a apregoar em defesa do café do bairro e da padaria de balcão de pedra, em detrimento das cadeias cagonas e pretensiosas onde o serviço é impessoal e tão menos amistoso.
Afinal não percebo se o que é nacional é bom ou não.
Enfim, é que para além de distraída, às vezes baralho-me.
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