terça-feira, 4 de março de 2014

Agora que se acabou o Carnaval...

...eles voltam todos a ser muito machos e elas voltam todas a ser muito puras e castas, que isto de brincar às pegas e matrafonas é só a reinar e apenas uma vez ao ano. Afinal de contas é Carnaval e ninguém leva a mal.
Conta a minha mãe que na sua altura de menina tinha medo do Carnaval. Lá na terra de onde ela veio, lá no sul de Angola onde Judas perdeu as botas e andou às voltas no deserto para as encontrar, os pescadores locais tinham por hábito, não encarnar freiras, enfermeiras, Capuchinhos Vermelhos nem vampiras saídos da boite nem tampouco vestirem-se de matrafonas badalhocas, mas de usarem tudo o que era rede, apetrecho de pesca e pinturas que os deixasse com um ar realmente demoníaco, de tal maneira que a pobre coitada da mãe dizia ficar com febre, tal era o pânico que aquilo tudo lhe causava. Eu não compreendia como é que era possível alguém ter medo do Carnaval. Para mim o Carnaval era assim uma espécie de concentração anual de fadas e princesas e um misto de anúncio da Evax onde a festa era feita com confetis e serpentinas pelo ar . Passada a fase do tule, do cetim e das purpurinas veio a fase dos ovos, dos balões de água e das bombas de mau cheiro nas aulas de matemática e nas pastelarias cheias de senhoras a beber chá. Aqui, achava eu, estava no auge do Carnaval underground.
Agora que começo a perceber o medo que o Carnaval causava à minha mãe e na verdade, mesmo sem redes e sem apetrechos, aqui na terra onde vivo e 50 anos depois, a coisa vai dar quase ao mesmo: têm todos um aspecto demoníaco e anda tudo à pesca.
 

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